O momento certo do contador tomar decisões e assumir seu protagonismo
Neste
ano, muito mais do que atentar às novidades nos sistemas e ferramentas a serem
utilizadas, os profissionais contábeis têm o desafio de acompanhar todos os
novos desafios do ambiente de negócios brasileiro, na contabilidade pública, na
auditoria e na perícia contábil, e contribuir com a tão falada mudança de
cultura empresarial.
O surgimento ou entrada em vigor de novas obrigações e
programas não chegou a apavorar. Umas das causas foi o grande número de
prorrogações, a exemplo do recente adiamento da data de início de entrega do
eSocial para 1 de janeiro de 2018.
Contudo, nos últimos 12 meses, muita coisa mudou no cenário
político e econômico nacional, e as áreas das Ciências Contábeis foram ligadas,
de alguma maneira, a escândalos fiscais. Talvez, o mais emblemático deles tenha
sido as pedaladas fiscais, que levaram à deposição da presidente eleita em
2014, Dilma Rousseff. Porém, outros desvios usaram aquilo que se convencionou
chamar de contabilidade criativa para “maquiar” as contas e fazer algo que nada
tem a ver com Contabilidade.
Por isso, entidades representativas apontam o trabalho de
conscientização junto à sociedade civil na tentativa de mostrar o real papel
das Ciências Contábeis como um dos mais importantes a serem feitos nos próximos
meses. É preciso desmistificar a imagem de que a manipulação faz parte da
profissão e assinalar as ferramentas de controle dos procedimentos e
informações prestadas.
A realidade, destaca o presidente do Conselho Regional de
Contabilidade (CRCRS), Antonio Palácios, é que muitas das fraudes poderiam ter
sido evitadas se a Contabilidade fosse mais valorizada e utilizada. “No
entanto, ela foi usada para corrupção, e nunca para trazer soluções aos
problemas ou como ferramenta de transparência e qualificação das informações”,
ressalta Palácios.
A crise financeira, complementa o presidente do Sescon-RS,
Diogo Chamun, traz necessidade maior de organização e planejamento por parte
das empresas. “Os contadores e as empresas contábeis precisam saber reinventar
sua atuação”, diz Chamun.
É o momento de o papel social da Contabilidade se
sobressair, mais do que nunca, aos interesses econômicos. “Os profissionais
devem agir como gestores empresariais, avaliar os dados de forma a torná-los
subsídios para as decisões empresariais ou do setor público e agregar valor ao
serviço prestado”, explica Chamun.
Com a economia ainda recessiva, muitos clientes dos escritórios
de contabilidade têm fechado as portas ou buscam reduzir os honorários; mas,
com organização, é possível encontrar oportunidades. “Indico que os
profissionais tentem oferecer serviços acessórios, consultorias, revisões
tributárias, de gestão de RH, gestão financeira e previdenciária, por exemplo.
Nós temos condições de fazer tudo isso, mas, às vezes, não paramos para pensar
no negócio”, salienta. o presidente do Sescon-RS.
Área pública apresenta grande potencial de expansão graças às normas internacionais
Nesse panorama de franca expansão das ferramentas de
controle e de valorização da transparência, ganham valor a Contabilidade
Pública e a apropriação das Normas Internacionais de Contabilidade Aplicadas ao
Setor Público (em inglês, Ipsas).
Durante muitos anos, não se olhava para esse segmento da
ciência. A Lei nº 4.320 era de 1964 e estava completamente defasada em relação
a tudo que foi evoluindo. A partir de 2010, quando o Conselho Federal de
Contabilidade (CFC) apresentou as novas normas, o padrão internacional passou a
valer também para a área pública, e muitas das normas que nem eram observadas
passaram a ser obrigatórias também.
A partir
da implementação das Ipsas, o mercado passou a enfrentar dois problemas, lembra
o presidente do Conselho Regional de Contabilidade do Rio Grande do Sul
(CRCRS), Antonio Palácios. O primeiro foi o total despreparo dos profissionais
que atuam e atuavam, o que, é claro, foi mais sentido ainda pelo pouco ou
nenhum investimento que a área pública realizou sobre os profissionais em
atuação.
Em
segundo lugar veio a necessidade de investir em transparência e arcar com as
consequências disso. “Ao aderir ao padrão internacional, não há como encobrir
uma série de fatos de má gestão pela omissão das normas. Passamos por uma
dificuldade grande para que profissionais da área pública, principalmente no
interior, recebam capacitação”, ressalta Palácios.
Assim
como nas mais diferentes transações realizadas por entes públicos, as eleições
também passaram a ter de contar com o aval de profissionais contábeis. Em 2016,
pela segunda vez, as prestações de contas de candidatos têm de passar pelo
crivo de contador, o que, para Palácios, configura mais uma prova da
importância de o contador se fazer presente e atuante sobre a gestão pública.
“A
responsabilidade é grande, pois, se o contador não está bem preparado, o que
poderia ser espaço para crescer pode resultar no oposto”, diz Palácios. Em
alguns casos, pode ser necessário até mesmo negar-se a avalizar as prestações
de contas para evitar sanções futuras, indica o presidente do CRCRS.
Independentemente
da área de atuação do profissional contábil, o presidente da Federação dos
Contadores e Técnicos em Contabilidade do Rio Grande do Sul (Federacon-RS),
Glicério Claristo Bergesch, destaca a necessidade de investimento permanente em
ferramentas de controle informatizadas, sempre com o cuidado de tratar com
fornecedores idôneos, que ofereçam sistemas licenciados e a devida segurança
dos produtos e serviços. “Sempre que há uma certa instabilidade no cenário
econômico e político do País, esta situação indesejada acaba refletindo nas
rotinas administrativas. Ao contador, é imprescindível acompanhar muito de
perto o que o mercado está oferecendo, quais as novidades, contar com
equipamentos compatíveis para arquivamento e buscas de dados e avaliar o
arquivamento em nuvens, por exemplo”, salienta Bergesch.
Obrigações acessórias estão entre os principais entraves
Um os grandes entraves apontados pelas entidades
representativas para o pensamento estratégico entre os contadores e a chegada
das Ciências Contábeis a um outro patamar é a grande quantidade de obrigações
acessórias. Os atos ocupam a maior parte do tempo dos profissionais, e não
exigem conhecimento técnico mais aprofundado.
Essas obrigações poderiam ser feitas por quaisquer
profissionais, mas acabam ocupando a maior parte do tempo dos profissionais. “A
Receita Federal deixou uma série de trabalhos de sua competência para os
contadores fazerem. Hoje, trabalhamos muito mais como agente da Receita do que
fazendo a contabilidade, gerando informações e servindo o administrador e o
contribuinte”, lamenta Antonio Palácios, presidente do CRCRS.
Além de gerar estresse entre os profissionais, as obrigações
aumentam o risco de o contador ser cobrado por qualquer sanção imposta ao
cliente. “Como cuidar de todas as obrigações acaba sendo de responsabilidade do
contador, é comum que a multa recaia sobre o profissional”, diz Palácios, salientando
que essa tem sido uma das maiores reclamações, apesar de a entidade não ter
muito o que fazer.
Auditoria e perícia são os ramos que mais absorvem os recém-formados
Esqueça a imagem do contador como um profissional analógico,
sentado à mesa atrás de uma pilha de papéis. O perfil mudou. Até 2004, pouco
mais de 61 mil profissionais eram mulheres. Hoje, elas são mais de 157 mil –
29,5% do total de profissionais contábeis brasileiros, conforme levantamento do
CFC.
Conforme o Ministério da Educação, o curso de Ciências
Contábeis é o 10º mais procurado por estudantes que buscavam ingressar na
universidade via Sistema de Seleção Unificada (Sisu) em 2015. A busca por
estabilidade aparece como um dos fatores determinantes. Levantamento recente do
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) revela que quase 94% dos
contabilistas brasileiros estão trabalhando na área.
As áreas preferidas pelos jovens são auditorias internas e
externas em médias e grandes empresas e a perícia contábil. Em seguida aparecem
os escritórios de contabilidade, verifica Glicério Claristo Bergesch,
presidente da Federacon-RS.
O presidente do CRCRS, Antonio Palácios, afirma que o
mercado está demandando muitos auditores, principalmente em início de carreira,
devido a uma crescente buscar por segurança em todos os processos submetidos ao
Fisco. A área de perícia também cresce sensivelmente e vem conquistando espaço
devido à obrigatoriedade da realização de um Cadastro Nacional de Peritos –
novidade que deve democratizar o acesso dos peritos ao mercado e garantir
segurança ao Judiciário.
Apesar dos escândalos, as Ciências Contábeis estão em franca
expansão e, sem ela, não será possível ultrapassar os obstáculos impostos por
uma crise. O aumento no número de novos profissionais e estudantes e de
contadores em busca constante por qualificação não deixam dúvidas de que,
enfim, há e haverá o que comemorar.
Matéria: Jornal do Comércio
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